sábado, 29 de outubro de 2011

O PENTECOSTALISMO NO CONTEXTO DA SEGREGAÇÃO RACIAL



 INTRODUÇÃO

                É impossível falar do Movimento Pentecostal sem uma abordagem histórica e cultural do contexto em que teve seu início explosivo, e o pano de fundo desse grande avivamento da Igreja, foi o período da segregação racial nos Estados Unidos. Negros e brancos estavam divididos pela política segregada da nação, além da forte oposição também preconceituosa pelos imigrantes hispânicos. Início do século XX, foi nesse contexto berrante de racismo que surgiu um líder disposto a clamar por um despertar espiritual para a Igreja do Senhor, especialmente para sua própria vida. William Seymour, um filho de ex-escravos negros após um poderoso discipulado com Charles Fox Parhan, passou a ensinar e buscar o batismo no Espírito Santo com a evidência bíblica do falar em línguas estranhas, dando início à Missão Evangélica da Fé Apostólica na lendária Rua Azuza.
 
A-     UM MOVIMENTO DE ORIGEM AFRO-AMERICANA

Não há como negar que a espiritualidade afro-americana caracterizou a cultura pentecostal como conhecemos hoje, e até mesmo a natureza emocional das manifestações ocorridas no galpão da Rua Azuza 312. Vale ressaltar que elementos cruciais do movimento pentecostal como sua liturgia espontânea e sua musicalidade extremamente alegre, tiveram profunda influência da diversificada cultura africana. Diferentemente dos escravos que “migraram” para o Brasil, por exemplo, aos escravos nos Estados Unidos não era permitido nenhum tipo de instrumento de percussão que pudesse se tornar arma, assim, os negros desenvolveram formas de musicalidade e expressão corporal que manifestassem suas emoções e sentimentos, dando origem a ritmos como o blues, e no contexto cristão dos escravos convertidos às primeiras formas do gospel afro-americano. O fato é que a credulidade e espiritualidade dos afro-descendentes deixaram sua marca latente nos pentecostais em todas as épocas.

B-      A NATUREZA INCLUSIVA DO MOVIMENTO PENTECOSTAL
O que mais contribuiu para tornar o movimento pentecostal alvo de perseguições, tanto por parte da comunidade como da imprensa de Los Angeles na época, foi justamente este “mix” de raças e culturas que manifestavam sua “nova” espiritualidade e um antigo estábulo abandonado. O antagonismo maior se dava pela liberdade de culto e até liderança por parte especialmente de três classes: negros, hispânicos e mulheres. Na Missão da Rua Azuza, mulheres já tinham seu espaço muito antes de conquistarem o direito de votar nos EUA, elas tiveram significativa importância no crescimento do movimento, além disso, muitos mexicanos e califórnios exerceram poderosos ministérios evangelísticos. Porém, o destaque maior pertencia indubitavelmente aos negros, que pareciam estar recebendo de Deus os “juros” pelos anos de escravidão e morte. O pastor e líder do movimento, o afro-americano William J. Seymour se tornou uma das figuras mais importantes da história do cristianismo.

C-      O PRIMEIRO CISMA NO PENTECOSTALISMO MUNDIAL
A primeira denominação pentecostal oficial da história foi a Church Of God In Christ (Igreja de Deus em Cristo), fundada e liderada pelo Bispo afro-americano Charles Harrison Mason. Era uma igreja predominantemente de negros, embora com muitos brancos e hispânicos. Por ser a única denominação legalizada e apta para fornecer licenças para pregar e abrir igrejas, era vantajoso para ministros de todas as raças. Mas, devido à severa segregação racial nos Estados Unidos naquela época, aproximadamente trezentos pastores brancos, já com suas licenças ministeriais, não quiseram mais ser liderados por bispos negros, e se desligaram da COGIC reunindo um conselho no ano de 1914 em Hot Springs formando aquela que conhecemos como a querida Assembléia de Deus, que teve sua expansão maior no Brasil. Aliás, vale ressaltar um registro histórico: “Vingren indagou a respeito da questão (do novo nome da denominação que até então era a Missão da Fé Apostólica) e informou que nos Estados Unidos haviam adotado o nome Assembléia de Deus ou Igreja Pentecostal. Houve unanimidade em torno do primeiro nome mencionado. Em 11 de Janeiro de 1918, o título Assembléia de Deus foi oficialmente registrado...” AS ASSEMBLÉIAS DE DEUS NO BRASIL – Sumário Histórico Ilustrado, pag. 59. Assim, o centenário da denominação Assembléia de Deus ocorrerá em 11 de Janeiro de 2018, e o centenário da primeira denominação pentecostal registrada (COGIC), se deu 1997. A COGIC foi organizada em 1907, porém, fundada em 1897. O primeiro grande cisma no Movimento Pentecostal foi, portanto, o desligamento da Igreja de Deus em Cristo por parte de alguns líderes, para a formação da primeira Assembléia de Deus (1914).
D-     UM DOS GRANDES PRECURSORES DO MOVIMENTO ANTI-SEGREGACIONISTA
Evidentemente quando falamos de movimento anti-segregacionista e direitos civis dos negros, nosso entendimento histórico logo nos reporta ao líder negro Martin Luther King Jr., e nada poderia ser mais justo, haja vista que o investimento de vida desse líder batista foi o fim da segregação racial na América e a revisão dos direitos civis. Porém, muito antes do ativista Luther King se manifestar sobre essa questão, no início do século XX, o fundador da Igreja de Deus em Cristo já fomentava o conceito de unidade das raças, e por vezes foi preso por difundir tais princípios. Em sua simplicidade ele propôs uma parábola que se tornou histórica; ele dizia que se faltar ou a parte branca ou a parte negra dos olhos, não poderemos enxergar. Nas reuniões alegres da COGIC, era comum ver brancos e negros cantando e dançando juntos (o que era inconcebível naquele contexto político). Um fato histórico interessante é que o último sermão de Martin Luther King, foi no templo Mason da COGIC em 1968, com o tema: “Eu estive no topo do monte, eu vi a terra prometida”. É importante ratificar que a Igreja de Deus em Cristo nunca foi e não é uma igreja de negros, é uma igreja de cultura afro-americana, porém de natureza inclusiva, com pastores e bispos negros e brancos, trabalhando juntos.  
E-      A CONFRATERNIZAÇÃO HISTÓRICA ENTRE A IGREJA DE DEUS EM CRISTO E A ASSEMBLÉIA DE DEUS
Em 1994, após anos de separação racial entre negros e brancos da Igreja de Deus em Cristo e da Assembléia de Deus, ocorreu o chamado “Milagre de Memphis”, quando líderes da AD e da COGIC, representados pelo Superintendente Geral Tomas E. Trask e pelo Bispo Geral Charles E. Blake respectivamente, se congregaram para uma reconciliação histórica. O Espírito de Deus se moveu sobre um dos pastores assembleianos para lavar os pés de um pastor negro, como forma de pedir perdão aos irmãos negros pelos anos de separação racial e perseguição, e pelo sangue derramado em função dessa divisão, além de honrar e a memória de William Seymour. A nobreza do ato inspirou o Bispo Charles Edward Blake (Bispo Sênior da COGIC) a manifestar reciprocidade e fazer o mesmo. Hoje, a Igreja de Deus em Cristo é a maior denominação pentecostal dos EUA, e a que mais cresce no mundo, juntamente com a querida Assembléia de Deus que também tem experimentado crescimento vertiginoso. Lamentavelmente, no Brasil, a história pentecostal parece inacessível e negligentemente omitida pelas grandes editoras com vínculo pentecostal, e os membros da COGIC devem conhecer sua própria história para difundi-la. Histórias como a de que o Bispo Mason foi um dos financiadores da viagem dos missionários suecos Daniel Berg e Gunnar Vingren à Belém do Pará, onde o pentecostalismo aportou e se expandiu com a Assembléia de Deus. A história deve ser honrada, e a Igreja de Deus em Cristo é pioneira na história do pentecostalismo.
CONCLUSÃO
Dada a importância histórica dessa primeira revista de Escola Bíblica da Igreja de Deus em Cristo no Brasil, não poderíamos deixar de abordar elementos históricos de nossa Igreja, que tem sua significação inexorável na teologia pentecostal e no pentecostalismo como movimento de Deus. Sinta-se orgulhoso por fazer parte de uma Igreja forte, bíblica e cheia do Espírito Santo, a Igreja de Deus em Cristo, a Igreja da santidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário