sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

EVANGELISTA, O AMIGO DE PECADORES


A natureza inclusiva do ministério de Jesus foi extremamente confrontadora para os judeus, com sua cultura religiosa de separação ascética. Era inadmissível para o judeu ortodoxo, em especial o fariseu, a mera comunicação visual com gentios ou pecadores; seu elevado padrão de auto-justiça e moralidade, fazia com que estes religiosos extremistas enojassem aqueles que professavam sua fé e seu estilo de vida. Surge, então, Jesus de Nazaré, com uma nova proposta de alcance das massas, Ele não queria fazer prosélitos do judaísmo, nem tão pouco impor novos dogmas ou leis às pessoas, Ele as convidava para entrar no Reino de Deus, com sua Lei do Espírito, sua contracultura, e suas promessas vindouras. Mas este não era o grande problema na perspectiva dos fariseus; o problema era o público alvo de Jesus: Todo o que crê. Indignado com o critério intolerante do “crivo” religioso dos judeus, Jesus desabafa:

E disse o Senhor: A quem, pois, compararei os homens desta geração, e a quem são semelhantes? São semelhantes aos meninos que, assentados nas praças, clamam uns aos outros e dizem: Nós tocamos flauta, e não dançastes; cantamos lamentações, e não chorastes. Porque veio João batista, que não comia pão nem bebia vinho, e dizeis: Tem demônio. Veio o Filho do Homem, que come e bebe, e dizeis: Eis aí um homem comilão e bebedor de vinho, amigo dos publicanos e dos pecadores.
Lucas 7:31-34

         Este foi o apelido que Jesus recebeu, “Amigo de pecadores”, e este é a realidade, pois até então, os pecadores não tinham ninguém por si, senão a acusação, rejeição e exclusão social, mas agora, em Jesus, ele encontram uma nova mentalidade sobre o interesse de Deus por eles.

         Jesus é o Evangelista por excelência, Ele é, não somente o principal propagador da Boa Nova do Reino de Deus (o Evangelho), como é também, o autor desta Boa Nova; e Ele mesmo nos deixou um paradigma absoluto e imutável para o ministério evangelístico com sua mentalidade e visão inclusiva e contextualizadora.

         Inserido em uma cosmovisão judaica separatista, Davi externou um celebre Salmo que em sua época refletia a vontade de Deus para o povo de Israel: “Bem aventurado o varão que não anda segundo o conselho dos ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores.” (Salmo 1:1).
         Não desejo em hipótese alguma ferir a ortodoxia bíblica veterotestamentária, mas considerando a nova proposta de Jesus de alcance dos desafortunados irreligiosos, não podemos como Igreja de Deus em Cristo Jesus, praticar a literatura desse texto, senão, apenas o primeiro conselho davídico para os nossos dias: “não andar segundo o conselho dos ímpios”. Perceba, porém, que Jesus em seu ministério terreno não foi guiado pelo conselho de homem algum, mas pelo Espírito Santo, embora, contrariando o salmo, ele constantemente se detinha no caminho dos pecadores, e sem constrangimento se assentava na roda dos escarnecedores; a grande diferença era que Ele não pecava nem escarnecia, mas influenciava. Este é o legado de um verdadeiro Evangelista e de um cristão com visão apostólica, ao contrário dos cristãos neófitos ou hipócritas, ele se dá com os não crentes.
         Este “dom” evangelístico de contextualização consiste em pelo menos cinco aspectos a serem desenvolvidos pelo aspirante a evangelista e pela Igreja Apostólica: (1) Um discernimento da mente dos não crentes; (2) Uma linguagem peculiar aos não crentes; e (3) Uma interação sem medo com os não crentes; (4) Uma familiarização num nível pessoal com os não crentes; (5) Uma habilidade de compreender e sanar crises enfrentadas pelos não crentes. Acerca desses cinco pontos falaremos numa próxima postagem.

         No contexto em que o apóstolo/evangelista Paulo orientava a Igreja de Corinto acerca do procedimento disciplinar apropriado para lhe dar com um caso de extrema imoralidade sexual dentro da igreja, ele chega em certo ponto e escreve:

Já por carta vos tenho escrito que não vos associeis com os que se prostituem; isso não quer dizer absolutamente com os devassos deste mundo, ou com os avarentos, ou com os roubadores, ou com os idólatras; porque então vos seria necessário sair do mundo. Mas, agora, escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se irmão, for devasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com o tal nem ainda comais.
I Coríntios 5:9-11

         Esta uma das marcas da consciência evangelística, a dissociação com os falsos irmãos, e a associação com os descrentes pecadores. O ponto aqui não é comunhão, mas sim influência. Jesus comparou o Reino de Deus com o fermento (Mateus 13:33), e uma das características do fermento é que não é a massa que influencia e altera o fermento, mas o fermento influencia e altera a massa, e na concepção apostólica tanto de Jesus Cristo, quanto de Paulo, o fermento ruim não é o incrédulo pecador, mas sim o pseudo-religioso e o crente profano (Mateus 16:6, 12; I Coríntios 5:6-7).

         A mentalidade evangelística legalista de muitas igrejas de nosso século não se parecem em nada com o método apostólico de evangelização. Não acredito que Jesus ficou incomodado ou perturbado com o fato de um de seus mais influentes apóstolos ter caminhado três anos e meio com Ele sem renunciar a espada que estava em sua cintura, Jesus se fazia de desentendido com a situação, pois sabia que a ação do Espírito Santo no advento de Pentecostes o transformaria. Não adiantaria tirar a espada da cinta e não tirá-la do coração; não adianta vivermos regidos por códigos religiosos de leis: “pode isso, e não pode aquilo”, isso não é transformação, é mera religião (Colossenses 2:20-23). Não ganhamos almas para Cristo, para sobrecarregá-las com nossas ordenanças dogmáticas denominacionais; não podemos tentar usurpar o papel regenerador do Espírito.
         Parece-nos que Paulo possuía uma abordagem contemporânea do evangelho, repleto da doutrina de Cristo oculta em linguagem greco-romana (vigente na época), porém, desvinculada dos elementos ritualistas da fé judaica. E nós, como uma geração apostólica, precisamos desenvolver uma “nova” linguagem missiológica; em outras palavras, precisamos renunciar nosso “evangeliquês igrejeiro”, encontrando o equilíbrio de uma fala sã e irrepreensível, e ao mesmo tempo moderna e culturalmente contextualizada. Da mesma forma, Paulo também se utilizava de uma metodologia transcultural arrojada, que perturbou o senso de sagrado e profano dos religiosos de seu tempo, e certamente teria causado a mesma perturbação em igrejas retrógradas em nossos dias. Em poucas de suas palavras podemos compreender a visão evangelística e missionária de Paulo:
Porque, sendo livre para com todos, fiz-me servo de todos, para ganhar ainda mais. E fiz-me como judeu para os judeus, para ganhar os judeus; para os que estão debaixo da lei, como se estivera debaixo da lei, para ganhar os que estão debaixo da lei. Para os eu estão sem lei, como se estivera sem lei (não estando sem lei para com Deus, mas debaixo da lei de Cristo), para ganhar os que estão sem lei. Fiz-me como fraco para os fracos, para ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos, para, por todos os meios, chegar a salvar alguns
I Coríntios 9:19-22

         Nas palavras do versículo 22 Paulo revela a abrangência de sua estratégia: “...para, por todos os meios, chegar a salvar alguns.

         A rejeição e a perseguição nem sempre é reflexo de uma igreja santa e separada; na verdade, no modelo apostólico de avivamento em Atos, a igreja estava “...caindo na graça de todo o povo. E todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de salvar.” Muitas vezes, o motivo real da igreja moderna ser rejeitada e pisada pelos homens, é que ela é um “sal imprestável” que perdeu o sabor e não tempera. “Vós sois o sal da terra; e, se o sal for insípido, com que se há de salgar? Para nada mais presta, senão para se lançar fora e ser pisado pelos homens.” (Mateus 5:13).
         A Igreja é comparada por Jesus a uma poderosa cidade, geograficamente edificada sobre um monte; também é comparada a uma luminosa lâmpada acesa, colocada em evidência num velador de uma casa escura, assim, Jesus exorta a que não nos escondamos ou nos alienemos deste mundo como, pois a luz só é luz brilhante em contato com as trevas (Mateus 5:14-15). Em sua oração sacerdotal Jesus rogou ao Pai, a que não nos tirasse do mundo, mas que nos livrasse do mal (João 17:15-18).
         Um cristão apostólico, e especialmente um genuíno evangelista, não pode resplandecer a sua luz no contexto interno da Igreja, ao contrário, como disse o Senhor: “Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai, que está nos céus.” (Mateus 5:16).

         Acredito que a atitude evangelística mais arrojada e confrontadora de Jesus foi sua entrada na residência do chefe dos corruptos cobradores de impostos da época, Levi. Somente para que entendamos o caráter radical da rejeição desses chamados publicanos por parte dos judeus, eles eram também judeus, porém, trabalhavam colhendo de seus patrícios, impostos abusivos para o governo romano, além disso, eram homens profanos e destituídos dos valores morais oriundos da Lei de Moisés. Assim, houve a exigência de uma irrevogável separação de todo judeu ortodoxo desses pecadores inveterados. A narrativa bíblica não somente nos diz que o Mestre não somente viu Levi na coletoria e o chamou, mas também, entrou em sua casa. Isto era inadmissível, uma atitude das mais profanas e contaminadoras que um judeu poderia tomar, especialmente em se tratando de um rabino tão aclamado na época como Jesus. Certamente, até mesmo seus discípulos o censuraram secretamente. E respondendo a indagação legalista dos escribas da lei e dos fariseus, Jesus declara: “...Os são não necessitam de médico, mas sim os que estão doentes; eu não vim chamar os justos, mas sim os pecadores.” (Marcos 2:17).
         Precisamos parar de oferecer “quimioterapia para os resfriados da igreja”; a verdadeira praga está assolando o mundo à nossa volta, e ela se chama PECADO. Vamos às casas e mesas dos doentes pecadores e levemos o único remédio que os pode curar de fato, a Vida Eterna, por Cristo Jesus, nosso Senhor (Romanos 6:23).
         Voltemos a citar Paulo de Tarso, pois nenhum outro ministro compreendeu essa natureza abrangente da influência do evangelho quanto ele. Considerando a mentalidade de Jesus Cristo (I Coríntios 2:16), Paulo escreve: “E, se algum dos infiéis vos convidar e quiserdes ir, comei de tudo o que se puser diante de vós, sem nada perguntar, por causa da consciência. Mas, se alguém vos disser: Isto foi sacrificado aos ídolos, não comais, por causa daquele que vos advertiu e por causa da consciência; porque do Senhor é a terra e toda a sua plenitude.” (I Coríntios 10:27-28).
         Este deveria ser o apelido de cada evangelista e de cada crente cheio do Espírito Santo e com a mente de Cristo: “AMIGO DE PECADORES”
         Deus em Cristo o abençoe.


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